O curta-metragem Kassandra com K foi eleito o Melhor Curta Brasileiro pelo Júri Popular no 14º Festival Internacional Rio LGBTQIA+, realizado na última quarta-feira (9), no Rio de Janeiro. Esta é a segunda produção piauiense a ser reconhecida no evento. Na mesma noite, o longa ‘A Cigana’ recebeu o prêmio de Melhor Longa Brasileiro, concedido pelo júri técnico.
Na trama, duas mulheres trans atuam como maquiadoras de defuntos em uma funerária, onde arte, amizade e resistência se entrelaçam em um cenário pouco convencional. Kassandra, a protagonista, encontra em Veronica — colega de trabalho e confidente — o acolhimento que nunca teve da própria família. Juntas, transformam o luto em um ritual de beleza e despedida, enfrentando o preconceito com afeto, dignidade e humor.
Tudo se transforma quando Kassandra se depara com o corpo do próprio irmão, rejeitado pela família e vítima da homofobia. Diante das memórias dolorosas e da recusa em aceitar a violência do destino, ela decide garantir a ele um enterro digno. Com roteiro e codireção de Rivanildo Feitosa, em parceria com Cícero Filho, o curta é uma obra sensível sobre identidade, rejeição, amor e recomeços — capaz de emocionar, arrancar risos e provocar reflexão. 
A origem do projeto está na inquietação criativa de Rivanildo Feitosa, que acredita que todo roteirista está sempre em busca de novas histórias. A ideia nasceu a partir de uma sinopse escrita para a rodada de negócios do projeto Primeiro Argumento, que chegou a despertar o interesse de uma produtora carioca. No entanto, Rivanildo optou por manter a narrativa com a alma e o sotaque nordestinos, ambientando o enredo em Teresina e valorizando suas paisagens e vivências locais.
“O filme busca diminuir distâncias, combater preconceitos e provocar reflexões sobre afeto e acolhimento. A relação entre Kassandra, Veronica e as amigas é bonita e repleta de afeto. Juntas, elas resistem e existem. Mas, acima de tudo, é uma história de humanidades, que fala sobre saúde mental e transformações — coisas que só a arte é capaz de revelar”, afirma o diretor.
Kassandra com K foi lançado durante a Mostra Therecine (Mostra de Cinema de Teresina). A próxima exibição acontecerá em São Luís, no final de agosto. O retorno a Teresina está previsto para outubro, em uma sessão inclusiva com recursos de audiodescrição e Libras, ampliando a acessibilidade da obra.
A protagonista é vivida pela atriz maranhense Acaíque, que se mostrou confiante após os testes presenciais. Ela relata que interpretar Kassandra foi um desafio, mas também uma experiência divertida. “Kassandra é muito diferente de mim. E eu gosto disso. Foi uma experiência desafiadora, mas divertida, interpretar uma personagem com comportamentos, visões de mundo e até formas de se vestir e agir tão distintas das minhas”, comenta.
Para Rivanildo, o reconhecimento conquistado pelo filme vai além do troféu: representa visibilidade para criadores e realizadores do Nordeste. Ele destaca a existência de muitos talentos na região que têm capacidade de contar suas próprias histórias com autenticidade, mas ainda enfrentam barreiras estruturais. “Precisamos de apoio e de políticas públicas contínuas, com editais que garantam o desenvolvimento, a produção e a circulação dos nossos filmes”, defende o cineasta, ressaltando o papel do audiovisual como instrumento de expressão e transformação social.
Acaíque foi quem recebeu o prêmio no Rio de Janeiro e contou que ficou surpresa com a vitória. “Não esperava conquistar o Júri Popular com essa história. Só desejo que o trabalho chegue ao público — seja com reações positivas ou negativas, estou feliz por tê-lo feito. E fico ainda mais grata por saber que ele já tocou tantas pessoas de forma positiva”, conclui.
Kassandra com K é um filme que equilibra com sensibilidade o riso e a dor, abordando temas densos como morte, suicídio e abandono, sem perder a leveza. Ao mesmo tempo em que denuncia feridas sociais, também celebra o afeto, o respeito e a empatia.
