Ayra Dias: entrecortada por culturas

A poeta, escritora e Drag Queen Ayra Dias é natural de São Caetano de Odivelas-PA, mas radicada em Teresina há alguns anos e vive nessa paixão dividida por culturas singulares e muito marcante na sua vida e carreira artística. Ela é graduanda de Serviço Social na Faculdade de Tecnologia e Educação Superior Profissional. Escreve no blog no site Medium. Além disso, Ayra já apresentou no evento “Atrans por elas” que foi organizado pela associação de homens trans do Piauí, onde também performou com declamações poéticas, participou do evento Frenéticas performando como Drag Queen e já palestrou sobre intolerância a comunidade LGBT para uma turma de marketing do Centro Universitário do Piauí – UNIFAPI. Ayra Dias também faz parte do movimento Ballroom e dentro do movimento ela também participa da expressão artística Vogue.

“A poesia e tudo que tenho feito representa quem eu sou, representa a minha existência e a existência das minhas.” Ayra Dias

Nome Completo: Ayra Cristina Sousa Dias

Descrição:  poeta, escritora e Drag Queen

Data de Nascimento: 20/08/1996

Local de Nascimento: São Caetano de Odivelas

Escrito por: Alisson Carvalho
Revisado por: Paulo Narley 

As raízes artística

Ayra Dias veio de uma família de pescadores e cresceu envolvida com as artes, já que a ligação com as manifestações populares precedem o seu nascimento. Por isso, a sua família transmitiu essa paixão para a artista. Ela começou a dançar aproximadamente aos oito anos de idade por influência da mãe, Maria Cristina, que ajudava na confecção da roupa da filha. Ayra diz que o boi é um elemento muito importante para o país, está presente nas diversas manifestações culturais brasileiras e, no Pará, aparece como uma dança agregadora para as comunidades e que atrai um turismo cultural. Aos onze anos de idade, Ayra Dias conhece o teatro escolar que a levará para um grupo de teatro amador da cidade permitindo que ela vivencie inúmeras experiências artísticas, o que foi capaz de ampliar os seus horizontes.

Uma ligação forte com a cultura do boi

Para Ayra Dias a cultura brasileira tem como uma das suas principais manifestações folclóricas as danças do boi que no Pará se torna um elemento de socialização das comunidades e que lá esses bois possuem distintas características como os bois de máscara e os de saia. As festividades do boi começam no mês de junho lá em São Caetano de Odivelas que é quando eles saem para dançar, deles Ayra destaca o boi Tinga que é o mais antigo da sua região, com oitenta anos de existência. Segundo Ayra, em São Caetano o boi se apresenta de forma única, tanto pela forma de dançar que também é chamada de brincar, como pelas roupas, música e todo o cortejo que vai de casa em casa com a população local acompanhando. Ayra participava dançando como uma mascarada “Eu ia pro boi fantasiada com uma roupa que não marcava o meu corpo e com uma máscara. Eu não tenha um gênero socialmente imposto ou reconhecido. Eu era a pessoa que estava dançando e isso era muito bom, pois tirava aquele peso de ser um corpo feminino e eu podia dançar a vontade.” O evento acaba se tornando um carnaval fora de época por atrair uma quantidade grande de brincantes e quando chega no final do mês acontece a fugida do boi que é o rito que demarca o encerramento da manifestação cultural no período.

Um corpo livre

A família de Ayra Dias sempre esteve envolvida com as festividades do mês de junho. Dessa forma, a mãe da artista tem como prática distribuir mingau aos participantes como forma de contribuir para o evento. Foi durante esse período que Ayra revelou a sua identidade de gênero para a sua mãe e, desde então, uma nova perspectiva surgiu, pois a arte está entrelaçada com todos os aspectos da vida da artista. A ação fez com que Ayra se libertasse das amarras e pudesse vivenciar de forma mais espontânea a dança do boi. Segundo a artista, sua escrita surgiu como forma de expressão dos sentimentos suprimidos por diversos motivos, afinal, para uma pessoa LGBTTQIA+, o mundo é um ambiente na grande maioria das vezes hostil. Nesse sentido, o refúgio de Ayra foi as letras. Assim, ela usava essa escrita como forma de desabafo, deixando as suas criações restritas ao âmbito privado. “A escrita é sentimento e eu acho que não teria como produzir qualquer tipo de texto, mesmo um acadêmico, sem qualquer tipo de envolvimento, sem me envolver afetivamente com o que estou criando”, frisa. Para Ayra, é essencial o diálogo artístico, pois o retorno, as críticas e os elogios servem como forma de entender o impacto daquilo que foi escrito. Afinal, não existe alegria maior para a escritora do que saber que suas criações sensibilizaram outras pessoas.

“A gente passa por um processo de assassinato simbólico diário, todos os dias nos temos nossas identidades negadas.” Ayra Dias

Imersa entre artistas

Ayra Dias conheceu a cena cultural de Belém e se aproximou das Drags Demônias, um movimento cultural que vem inovando e provocando a cena Drag paraense. O nome do movimento ultrapassa a questão estética, vai para além dos símbolos cristãos e se refere ao demônio interior, além disso a essência do movimento é levar os elementos culturais amazonenses para a arte Drag. Segundo Luna Skyssime, Demônia é pensar no coletivo tanto politicamente como socialmente e esteticamente. (As primeiras Drags que Ayra conheceu foi a Xirley Tão (considerada a grande matriarca das Demônios) e a Lilandra Melancia (uma das primeiras Drags que Ayra teve contato), mas a artista conta que outra grande referência foi o programa RuPaul’s Drag Race. Ayra conta que, mesmo sabendo a estética, formato e estilo da sua Drag, foi somente a partir da viagem à Belém que ela sentiu que era hora de deixar a sua arte eclodir nos palcos. De cara, Ayra Dias foi acolhida pela Haus of Carão, da qual faz parte atualmente e levou para a sua construção toda a sua cultura, com a sua religiosidade e identidade. Esse não foi somente o momento em que nasceu a Drag Boiúna La Belle, mas foi o momento onde ela foi montada com a assistência da Drag mais admirada por Ayra que é a Luna Skyssime. “Foi tão mágico, surreal, como um sonho. Quando o coletivo “Noite Suja” surge ele vem com uma ideia de transgressão. A arte passa por um processo de assepsia. Nesse sentido, algumas coisas são consideradas arte e outras não. E o “Noite Suja”, junto com as Demônias, vem com a ideia de sujar a noite, que eu acho linda.”

A Ballroom como um espaço de acolhimento

“A Ballroom é um espaço de afeto e surge como celebração da existência de corpos marginalizados, destaca-se as manas trans pretas. Em determinado momento da história algumas manas que estavam privadas de liberdade em centros de reclusão só tinham acesso à revista Vogue que era considerado um material que não oferecia risco. Então baseado nisso surge uma das primeiras vertentes do Vogue performance, posteriormente há também influências da arte circense. Os desfiles começam a acontecer nas balls (festas) para transgredir, para dizer que as manas pretas poderiam ser mulheres de alta classe, poderiam ser executivas.” Ayra Dias é integrante do movimento Ballroom, um espaço de acolhimento que acalenta todes que são estigmatizades e marginalizades. O movimento vem se espalhando por outras regiões e, atualmente, vem se fortalecendo no Piauí, mostrando a importância da união de todes. Além disso, tem como um dos elementos o Voguing, dança cujas referências são as poses das modelos da revista Vogue. A dança foi se popularizando graças ao clipe da cantora Madonna. “A Ballroom é como uma família, existe uma casa e tem a sua mãe e seus irmãos.” Ayra Dias conta também que existem as Houses e dentro dessas houses as pessoas dançam o Vogue, além de outras modalidades presentes nessas festas como a runway, que são como desfiles temáticos. “A Ballroom é um espaço de afeto e fortalecimento das nossas corpas, das nossas identidades, das nossas construções afetivas enquanto pessoas LGBTTs, enquanto pessoas negras. Ela nasce disso, é um movimento criado por pessoas trans e negras dos Estados Unidos.”

Ocupar espaços com arte

Ayra Dias é uma artista multifacetada e que entrelaça todas as suas vivências ao seu fazer artístico, ela traz para as suas criações todo o seu arcabouço teórico e vivencial, por isso a arte de Ayra é tão visceral, pois fala da realidade sentida. As poesias da escritora também funcionam como um mecanismo de transformação das angústias, usando toda a tensão por trás dos sentimentos para a produção de versos que encantam, revoltam, sensibilizam e alertam para as inúmeras violências produzidas pela sociedade. E para artista essas reflexões trazidas para a sua literatura e para a sua arte são também formas de resistir e ocupar cada vez mais espaços. “A poesia me liberta e representa a minha existência. Nós sempre fomos colocadas em espaços marginalizados e passamos por um processo de invizibilização. Quando nos apresentamos e ocupamos os espaços nós estamos defendendo a nossa existência. Esse enfrentamento é necessário para que as próximas gerações continuem existindo”, frisa.

Contatos

Instagram.com/ayrasdias/

Instagram.com/boiunalabelle/

Facebook.com/ayra.dias.501

Medium.com/@ayrasdias

Fotos

Vídeo

Última atualização: 29/04/2020

 

Caso queria sugerir alguma edição ou correção, envie e-mail para geleiatotal@gmail.com.

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