O Museu do Piauí recebe, durante o mês de janeiro, a exposição “Vozes – contra o estigma, preconceito e outras violências que acometem mulheres com hanseníase”, acompanhada de uma roda de conversa que busca sensibilizar a sociedade para os desafios enfrentados por essas mulheres. A atividade faz parte da programação da campanha Janeiro Roxo, voltada para conscientização sobre a hanseníase, e é apoiada pelo Centro de Inteligência em Agravos Tropicais Emergentes e Negligenciados (CIATEN).
“A exposição Quebrando o Silêncio é produto de uma pesquisa qualitativa em saúde, feita com mulheres atingidas pela hanseníase e também vítimas de violência. Essa sobreposição foi importante porque a hanseníase já está muito relacionada com o exíguo e o preconceito, e sendo mulher, esses aspectos são potencializados. E outras formas de violência foram identificadas a partir dessa aproximação e desse encontro. Então a exposição tenta apresentar essas narrativas todas das mulheres, em especial de uma delas, que sofreu violência a partir do contato com o próprio marido. Foi uma questão muito forte, muito densa, porque. A gente tem a expectativa que o casamento, o encontro entre duas almas, seja um encontro marcado por parceria, companheirismo, reunião, força, e não foi o que ela encontrou nesse encontro, nesse casamento, frisa Fábio Solon.
Além disso, Fábio Solon comenta que o caso supracitado mostrou outras formas de violência, como a violência mais psicológica, pois além das modificações físicas o medicamento deixa as pessoas com pouca disposição criando um conflito já que existe uma expectativa social para que as mulheres façam a gestão das atividades domésticas.
A exposição foi idealizada a partir de uma pesquisa qualitativa em saúde, que investigou as vivências de mulheres atingidas pela hanseníase no estado do Piauí. Elas enfrentam não só os desafios do tratamento da doença, mas também o estigma social e institucional, com consequências psicológicas e sociais devastadoras.
Dividida em quatro salas, a mostra utiliza a arte como uma poderosa ferramenta de sensibilização e mobilização social:
Sala 1 – Eldenira Rodrigues
Nesta sala, são apresentados desenhos feitos por mulheres que convivem com a hanseníase. As obras refletem suas dores, superações e a busca por dignidade em meio ao estigma. A exposição também dá voz a essas mulheres, evidenciando sua resistência e capacidade de transformação.
Sala 2 – Caminhos de Transformação
Aqui, desenhos produzidos por pesquisadores, docentes e profissionais da saúde exploram as barreiras enfrentadas por essas mulheres e a importância da construção de uma sociedade mais empática. A produção evidencia a urgência de quebrar estigmas e promover a inclusão.
Sala 3 – Entrelaçadas: da vulnerabilidade à força
Nesta seção, as obras criadas pela discente Maria Rita Amorim Braga abordam a interseção entre a hanseníase e a violência contra a mulher. O impacto físico e emocional dessa dupla exclusão é representado por meio de bordados e pinturas, que retratam as histórias compartilhadas durante a pesquisa.
Sala 4 – Quebrando o silêncio
Pinturas do pesquisador e docente Fábio Solon refletem sobre as realidades invisibilizadas dessas mulheres. A exposição busca provocar o público a enfrentar preconceitos e a construir uma sociedade mais justa e solidária.
“Essa exposição nasceu de uma iniciativa de evidenciar e também de representar dois agravos que perpassam a saúde coletiva em diversos aspectos e são permeados de questões sociais, que são extremamente delicadas, que é a violência contra a mulher e a hanseníase. O estado do Piauí apresenta estatísticas alarmantes em ambos os aspectos e é necessário que esses temas sejam debatidos, eles sejam expostos, pensados e difundidos para que tenham uma real mudança social, para que sejam combatidas as raízes e os desdobramentos desses agravos. Uma vez que o que é apresentado para a gente como estatística vai refletir a vida, o bem-estar e a saúde das mulheres, crava Maria Rita, estudante de medicina.
A pesquisadora completa informando que a arte foi o caminho escolhido para acessar a comunidade em geral, já que muitas vezes a pesquisa realizada dentro da universidade fica restrita à comunidade científica, aos alunos, profissionais da saúde, não conseguindo chegar aos espaços onde estão a comunidade em geral.
“O processo de criação foi baseado na pesquisa qualitativa, realizando entrevistas com mulheres acometidas pela hanseníase e propondo também um ambiente seguro para que houvesse compartilhamento dessas vivências.Como aluna que sou do curso de medicina da UFPI, eu posso dizer que essa pesquisa, esse projeto, foi um divisor de águas para o que eu entendia como conceito de saúde e me fez ter um olhar mais atento para o indivíduo que vai muito além da fisiopatologia, para além das manifestações clínicas. Eu acredito que é um incentivo ao estudante para que ele pense fora da caixa para que ele enxergue a pessoa em diversos aspectos, levando em consideração a expressão cultural que pode ser feito por meio de poesia, por meio de arte”, completa Maria Rita.
Roda de Conversa
Na abertura, marcada para o dia 17 de janeiro, uma roda de conversa reunirá representantes de instituições ligadas ao tema. O objetivo é aprofundar o debate sobre as práticas de cuidado e políticas públicas necessárias para enfrentar o estigma e a violência sofrida por essas mulheres.
A hanseníase, apesar de curável, ainda é cercada por preconceitos que afetam a autoestima e a inclusão social de seus portadores. No Piauí, que apresenta altas taxas da doença e de violência contra a mulher, essa realidade exige atenção especial. Segundo dados do IBGE, 6,6% das mulheres adultas no estado relataram agressões físicas em 2023, enquanto 384 casos de hanseníase foram registrados entre mulheres no ano anterior. Essa interseção demanda esforços para criar redes de apoio integradas, que considerem tanto os aspectos clínicos quanto os impactos psicossociais.
Local: Museu do Piauí
Exposição: 7 a 30 de janeiro
Roda de conversa: 17 de janeiro
Entrada: Gratuita