Devoradores da luz, por Alisson Carvalho

Diz-se douto, coisa mal estruturada na arguição dalguns microtons da fala. E disso se sabe depois de muito pernoitar na ânsia de tecer meio fio de fábulas incontestáveis, uns dizeres tintos e traçados pela malograda caneta da polidez dialética. Claro, nem tanto, mas pouco se sabe sobre o percurso se pouco se fala.

Alumiar milímetros no escuro é tão louvável quanto tatear cegamente e apaixonadamente sem um tico de visão. Mesmo assim não se pode dispensar a qualidade do conhecimento empírico adquirido durante o trajeto cego.

Escuridão é bicho medonho e o medo produz uns titubear de lavar a alma, pois nalguns recuos escapa-se do fatídico precipício, ao menos do precoce ruir. Quando não existe luz, simular os lampejos é essencial para atrair multidões. Os simulacros são verdadeiros gurus no oceano do breu contemporâneo.

Ah, quanta falta faz algumas âncoras no oceano de referências rasas… Quanta falta faz um relampejar qualquer, ao menos indicando o caminho da tempestade…

Ao que parece, rumores sobre os mastigadores dos vagalumes são reais. E quando há qualquer sinal da presença dos espíritos luminosos um ou outro espectro despido de cores deixa o seu estado de morbidez para riscar do mapa os ruídos. O corpo uníssono é a ordem, desafinar é impensável, intolerável.

Vocês constroem faróis sem lua, sem brasa, sem luz, sem mar, sem barcos – gritam e berram sem a clara percepção do que seja precaução e planejar.

[In]existe uma prosa, passada no boca em boca, mas que surte efeito tão logo seja aplicada: o assistencialismo cultural.

Antes, porém, é obrigatório revelar os assistencialismos acessórios que produzem as novas formas de escravidão intelectual. Cansa-se até os cabelos brancos investir na árdua tarefa de descrever o mundo, tão bem romantizado.

Já viram algum burguês trabalhar para algum burguês? A relação muda, a relação será horizontal, nunca verticalizada. Um corpo escravizado é cercado por sanções claras e, mesmo que costurem os lábios, o ser abjeto terá a mente livre. Uma mente escravizada jamais se rebelará, será um animal dócil se e somente se for alimentada pela subserviência,  afinal qualquer alma nasceu para ser livre, mesmo que não queira, mas se quiser já era, será força de trabalho.

Por isso, o típico cidadão comum, ótimo orador, destaque nos grandes salões, intelectual polido, modelo burguês, exemplo da sociedade e manequim da moral cristã já não lampeja no breu.

Há tempo para tudo, tempo para se desprender da árvore que frutifica para germinar noutro terreno. Cada um cria as suas próprias raízes, cada vegetal aprende sobre as intempéries que acomete o seu chão, experiência é conhecimento que se constrói progressivamente.

Alumiar em tempos de trevas parece loucura, soa como insanidade, pode atrair os devoradores de luz, os predadores das fagulhas e dá até certo pavor se o primeiro passo for seu.

Por isso, os exóticos e estranhos são centelhas no negrume do mar, é o desvio que tece as superestimadas inovações, ações novas ou apenas ações.

Por Alisson Carvalho

Foto: Caio Negreiros

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