Uma experiência por: BR Trans

O corpo é uma celebração, foi assim que mirei à Silvero quando entrei no Teatro e o vi em pé no centro do palco fitando a plateia de forma atenta enquanto balançava seu corpo de um lado a outro sem sair do lugar, usando um vestido de cor vermelha com tiras curtas e soltas que reforçavam o movimento. Parecia uma celebração, um corpo que espera e que se move, que olha e que para, um corpo que dança!

No cenário, um caixote preto, uma porta dobradiça uma mesa com suporte iluminado para um espelho, o que parecia ser um camarim, e era! Nesse espetáculo Silvero adensa alguns ambientes; um lugar para se montar, um palco, e uma BR, essa ultima como metáfora para os encontros.

Aos poucos as personagens femininas vão revelando seus nomes e suas histórias; em vários momentos essas histórias narradas por Gisele Almodóvar, um alter ego de Silvero. Ambos compartilham suas vivências e suas lembranças, na maioria das vezes em contato com outras figuras femininas também presentes no espetáculo.

Fotos: Victor Martins

Eram lembranças? Eram histórias inventadas? Eram histórias reais? Me peguei torcendo pra que fossem reais as histórias onde haviam possibilidades de descanso, de tranquilidade e de alegria para essas mulheres recontadas na dramaturgia do espetáculo, e eram.

Esse sentimento veio em fricção com a realidade dura e cruel que também é contada na Obra, no momento em que Silvero escuta uma música ou realiza uma ação no palco, atrás de sí uma projeção de imagens esfregando nas nossas caras o fato de o Brasil ser um dos Países que mais mata pessoas LGBTQIA+ no mundo.

Fotos: Victor Martins

Em seu corpo, o ator escreve os nomes dessas figuras que povoam seu imaginário e suas retinas, ele despende um tempo adensado para falar sobre elas, para contar das suas causas e das suas angustias. Não é um espetáculo trágico, mas também é, não é um espetáculo cômico, mas também é.

A sensação que tive foi de ver e ouvir uma homenagem do ator à essas pessoas, talvez trazidas também de questões pessoais do artista enquanto sujeito no mundo, em fricção com as demandas imperativas de uma sociedade homofóbica e binária como a sociedade em que vivemos.

Fotos: Victor Martins

Vi uma poesia no movimento de descascar um abacaxi, por conta da casca grossa, mas do conteúdo doce e suculento, esse mesmo abacaxi ofertado à plateia que comprou o jogo do ator, que aderiu às suas provocações e esteve presente. Tinha poesia também na leitura de uma carta, alguém chorou ao meu lado quando ouviu aquelas palavras de uma mãe e seus desejos de cuidado e proteção para um filho, filha ou filhe!

A sensação que tive foi de que, se virássemos Silvero do avesso, certamente ouviríamos as vozes e veríamos as imagens dos rostos das pessoas que ele evoca em seu espetáculo, porque estas parecem até estar presentes nele! E não estão?

FICHA TÉCNICA

Direção: Jezebel De Carli
Texto, atuação e trilha pesquisada: Silvero Pereira
Dramaturgia cênica: Jezebel De Carli e Silvero Pereira
Músico em cena, trilha original e adaptação de arranjo: Rodrigo Apolinário
Cenário: Silvero Pereira e Marco Krug
Iluminação: Lucca Simas
Realização: Quintal Produções Artísticas

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