3 noites com Maria Eugênia, novo livro de Vanessa Teodoro Trajano (entrevista)

Livro 3 noites com Maria Eugênia, de autoria de Vanessa Teodoro Trajano em um fundo branco e com um galho com pequenas frutas vermelhas do lado.

 

Revisão: Joana Tainá

“Na primeira noite a autora apresenta a protagonista no período de imaturidade típico do adolescer, na segunda noite Maria Eugênia já está imersa em sua juventude e na terceira nos deparamos com a Mulher na plenitude da vida adulta. Ao acompanharmos as mudanças e evoluções no comportamento da personagem, nos sentimos parte de seu processo, de seu crescimento.
A autora nos presenteia com uma bela obra de formação, que conduz o leitor ao universo psicológico e sexual da protagonista.”

Trecho do posfácio assinado por Denise Veras.

Com uma pegada de metaficção e erotismo acentuado,3 noites com Maria Eugênia é o novo livro de contos da Vanessa Teodoro Trajano. A autora relata experiências sexuais de uma jovem em diferentes épocas da sua vida, seja pela visão da própria, seja pela ótica de alguns amantes. Com essa proposta, Vanessa explora o gozo e a cruz da liberdade feminina.

As pessoas podem adquirir o livro diretamente com a autora, através do seu instagram @vanessateodorotrajano.

Geleia Total: Você falou uma vez que o livro é sobre as “Fases da vida de uma mulher. 3 momentos. 3 noites. 3 vidas”, o que podemos esperar sobre esse aspecto da obra? Haverá grandes passagens de tempo na vida de Eugênia?

Vanessa Teodoro Trajano: 3 noites com Maria Eugênia é um livro de contos, mas também pode ser lido como um romance, pois todas as narrativas giram em torno da mesma personagem homônima, em momentos distintos da vida.

Penso que a Maria Eugênia antes da primeira noite acabou de entrar na universidade, é uma jovem adulta. Por essa razão, é imatura, inconsequente e perversa, pois quase não tem empatia com os outros, a única coisa queimporta é o seu prazer, o seu ego feminino, a sua força.

Já para a segunda noite mostra uma Maria Eugênia de vinte e poucos anos que começa a sofrer as consequências de uma vida um tanto destemperada, uma mulher confusa, impetuosa, frágil, embora preferia morrer a reconhecer isso.

Depois uma mulher na faixa dos trinta e por último beirando os quarenta. Então sim, há saltos temporais no livro, apesar de que ele também possa ser lido aleatoriamente.

GT: Agora, poderia falar um pouco de como chegou ao título e sobre os simbolismos do número três para a história?

VTT: O título do livro surgiu da ideia de que as três noites representaram uma espécie de “virada” no fluxo de consciência da personagem, como uma cisão entre o que era e o que ela passou a ser. A Maria Eugênia da terceira noite não é a mesma da primeira, como a da primeira jamais se veria sendo ela mesma após esse marco.

Além disso, o número três possui diversos significados diferentes, seja para a numerologia, a astrologia, o tarô, o cristianismo, etc, bem como apresenta uma grafia estética que lembra o símbolo do infinito – perdendo apenas para o número oito, que é mais semelhante e mais completo.

Todavia, não podemos falar em completude ao nos referirmos à Maria Eugênia, pois ela está sempre em busca de alguma coisa, mas, como não sabe o quê, desconta essa ausência numa vida sexual intensa.

Daí a representação gráfica da ausência do “infinito” no número três, porque ele é o único que é resultante da soma dos seus antecessores, detonando assim todo o equilíbrio universal.

 

GT: Esse livro quase não foi publicado este ano por questões pessoais etc. O que ele significa para você e para sua carreira? E o quanto da Trajano podemos descobrir nessas páginas ao acompanhar Eugênia?

VTT: O livro já estava pronto há algum tempo, porém engavetado. Além dele, tenho mais dois nessa condição. Daí, quando eu estava com oito meses de gravidez, me dei conta que eu me esqueci de quem eu era. Depois que eu engravidei eu só quis saber de ser mãe, de quartinho de neném e de uma vida materna.

Um dia alguém mostrou para mim que eu estava cometendo um erro muito grande, e que a Trajano poderia perfeitamente coexistir com uma Vanessa mãe, que uma coisa não necessariamente excluía a outra. Então eu decidi publicá-lo.

Poderia ser qualquer um dos outros que estavam guardados, mas esse é mais especial para mim porque ele representa uma virada de vida, uma cisão, um marco. Esse livro é uma noite na vida da Trajano. Terceira, quarta, quinta? Vai saber. O que sei é que ele tem muito de mim.

Maria Eugênia é a mais parecida comigo de todas porque assumidamente somos uma só. O livro foi um exercício de memória. Sim, há ficção, bastante até, mas jamais irei entregar o ouro ao confidenciar o que é real aí e o que é invencionice. Que especulem, que briguem, que imaginem.

O que eu posso dizer é que às vezes um único pensamento se tornou estória. Ou um acontecimento fugaz. Ou mesmo um telefonema. Veja bem, uma coisa para ser verdadeira tem que ser exequível? Ela pode ser verdadeira também apenas no campo mental, e graças a Deus sempre fui muito criativa.

Para matar a curiosidade de vocês posso citar um exemplo. Eu já tive um affair bem mais novo do que eu que o chamava de “Nem” – vide Segunda noite. Mas isso é só (risos). O fato disso ser um fato não quer dizer que o conto inteiro seja igual à realidade, porque, como eu falei, não sabemos nem o que é real ou não, acho que até essa noção é inventada.

“Queria que aquela cena não tivesse acontecido, era para estarmos de conchinha conversando sobre miudezas, até mesmo recriminando pessoas não muito diferente de nós. Mas ela pulou essa parte e foi se vestir, estava de volta a mulher decidida e compenetrada de sempre, uma vivacidade com aparência inviolável em seu ar de quem pode tudo, inclusive chifrar o marido e sair como se nada tivesse acontecido. Senti um ódio desconfortável, mas repeli, o sentimento destoava daquela aparição que se erguia sobre mim a fechar a braguilha. Suspirei, eu teria que ser muito forte.”

Trecho do livro 3 noites com Maria Eugênia

GT: Há algo mais que queira falar sobre o livro, que talvez tenha ficado de fora dessa entrevista?

VTT: Uma curiosidade sobre a obra é que eu a dedico à Maria Padilha. Não é uma oferenda ou algo o tipo, mas um sinal de respeito à entidade e abertura a discussões.

A personagem Maria Eugênia cita a pomba gira algumas vezes no livro. Acontece é que muitas mulheres fazem isso para não assumirem os seus desejos, botando culpa na falange espiritual, demonstrando uma ideia muito equivocada a respeito dela.

Todo mundo já ouviu a frase “eu vi a gira dela”, quando encontra uma mulher de vermelho, fumando e bebendo, quando uma coisa nada tem a ver com a outra. Ou já ouviu: “a pomba gira tomou o meu marido”. Para começo de conversa, nenhuma mulher rouba marido de ninguém, pois se ele foi com outra foi porque ele quis, avalie uma entidade. Então, ao dedicar o livro à Maria Padilha, a intenção é chamar atenção para esse debate, até porque se a Maria Eugênia fez tudo o que fez foi também por vontade própria (risos).

Autora e obra

Vanessa Teodoro Trajano, apesar de nascida na Terra do Sol do Equador e residente no coração do Brasil, é pertencente a todos e a lugar nenhum ao mesmo tempo. Cidadã do mundo, atravessa a vida melhorando os textos alheios e contando as próprias histórias – seja na literatura, com Mulheres Incomuns (2012), Poemas Proibidos (2014),Doralice (2015), Ela não é mulher pra casar (2019 – Finalista do Prêmio Guarulhos de São Paulo na categoria Livro do Ano) e Supermulher e outras performances poéticas (2020 – Ebook pandêmico), seja no cinema, com o Curta-Doc A DESunião faz a FORCA! (2022).

“E depois de ter se contorcido inteira, de suas pernas terem volteado o meu pescoço e praticamente me enforcado durante os espasmos, o seu temperamento febril passou em questão de segundos para um choro brusco, quase convulsivo, tão forte que pensei que nunca veria o fim. Uma linha tênue além de tesão nos ligava, e ela era injusta e egoísta, embora estupidamente realista. Tentei abraçá-la, mas o corpo compactuava com a dor, queria fazer-se só. Via claramente a mais clara confissão dos nossos limites, dos mesmos que ultrapassávamos por simples querer. Eu a perdi. Não era mais a Maria Eugênia, a força, o rompante, o monumento, mas sim o projeto, o embrião, o anti-ser em estado natural de atordoamento quando desencontra a mão humana. Compreendi o quanto fui intruso de sua intimidade e senti a terrível necessidade de devolvê-la ao seu conforto. Aquilo que cultivávamos estava longe de ser amor ou paixão. Foi algo ainda mais denso e obscuro, e se buscávamos a pele um do outro é porque uma ânsia muito estridente gritava dentro do tórax e nos atraía fatalmente.”

Trecho do livro 3 noites com Maria Eugênia

Lembrando mais uma vez que vocês podem adquirir o livro diretamente com a autora, através do seu instagram @vanessateodorotrajano. Quer conhecer mais sobre a Vanessa Teodoro Trajano? Leia o perfil da autora que fizemos aqui na Geleia.

Quer Sugerir pautas? Manda a sua sugestão para: redacao.geleiatotal@gmail.com

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